I-
Se fosse capaz, não escreveria.
A luta contra o papel é desleal,
De uma angústia prazerosa.
Sobrevivo sonâmbulo,
Escravo do porvir.
Os advérbios sangram pela ferida da razão,
Os substantivos fogem às frias luzes da cidade.
Resta-me adjetivar meus sentimentos,
Torná-los intimamente públicos.
Secreção neural!
Palavras,
Donzelas, se não conquistadas,
São metastaseadas ao Mundo Inteligível.
Há quem não as usa,
Sequer as sente,
Quem as violente.
Talvez por isso se façam desdenhosas,
Pois quem é esbofeteado não esquece.
Volto a dormir...
A página mais branca que a minha pele,
Mais preta que meus pensamentos!
II-
Escrevo com uma caneta sem tinta.
A transposição é quase cirúrgica:
Das idéias ao papel,
O caminho é pseudomental,
Sublingual,
Entremeado por infindas vicissitudes.
Escrevo com uma caneta sem tinta.
Como o marceneiro sem martelo
E o filósofo sem presunção,
Não sou!
Camufladas sob os meus preconceitos,
Abrigadas da versofágica Racionalidade,
Palavras, palavras...
Escrevo com uma caneta sem tinta.
Por favor, dê-me um lápis!
III-
Se o que sinto não pode ser escrito,
Por que insisto?
Instinto?
Vício!
Com a espada sobre o pescoço,
Incansavelmente escrevo,
Inalcançavelmente escrevo!
De costas para a gramática,
Para a sintaxe, os morfemas e a ortografia,
Escrevo sem métrica, estrutura ou rima.
O que importa
Se o pronome é oblíquo ou reto,
Se os versos são heróicos ou sáficos,
Quando se escreve asfixiado pela vida?
Escrevo...
Porque sou analfabeto,
Porque sou tu, nós, eles.
Porque sinto medo!
Escrevo...
Com sangue diluído às lagrimas;
Com as chagas da utopia;
Com o coração que ainda pulsa fora do peito!
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
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2 comentários:
Incrível esse texto!
mateusssss....abraços do cabritãoo....rsss
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